segunda-feira, outubro 29, 2012

Festival de aviação em Alverca - 1933


Nos dias 10 e 11 de Junho de 1933, realizaram-se as "Festas da Aviação em Alverca", na pista internacional de Alverca, com a ocorrência de dois desastres, dois incêndios e destruição de 4 aparelhos, conforme noticia do Diario de Lisboa de 11 de Junho de 1933, que transcrevo abaixo e que espero tenham tanto prazer como eu na sua leitura.
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    ALVERCA,11 (Pelo telefone) - Os campeonatos de tiro, que precederam a grande festa de aviação em Alverca, terminaram ontem, à hora a que o nosso jornal já andava nas ruas. O da pistola de guerra, para disputa da Taça do "Diário de Lisboa", foi ganho pelo comandante do Grupo de Bombardeamento, sr. major Pinheiro Correia, classificando-se em 2º lugar o tenente Oliveira Teles. Por equipas a ordem foi: 1º - Grupo de Bombardeamento, 2º - equipa de Sintra e 3º - equipa da Amadora.
    A festa de hoje foi um grande acontecimento da Aviação. O programa foi cumprido à risca. O dia estava esplendido, sendo a visibilidade excelente. Desde manhã cedo, continuaram as provas de altura iniciadas ontem à tarde. A maior altura alcançada hoje, foi a de 5.400 metros pelo tenente Ciriaco. As provas de altura continuam amnhã ou depois.
    A partir das 11 horas, começaram a chegar automóveis, carroças e muitas camionetas cheias de gente, tendo a CP organizado dois combóios  especiais antes do meio dia e dois depois, que esgotaram as lotações. O campo começava a oferecer um aspecto curioso. As tribunas enchiam-se de senhoras. Altofalantes transmitiam concertos musicais que se ouviam em toda a pista.
    Foram chegando as esquadrilhas de Aviação dos vários aeródromos que iam alinhando por grupos, num total de 38 aparelhos, contando com a avioneta civil do Aero-Clube de Portugal. À roda do campo, amontoavam-se milhares de pessoas, muitas das quais formavam grupos que merendavam à sombra de tendas improvisadas. O aspecto era verdadeiramente de romaria popular.
    Em vários pontos, havia numerosas barracas que vendiam vinho, refrescos e sandwiches, que fizeram óptimo negócio. A todo o momento chegavam automóveis e pessoas vindas a pé, dos arredores de Alverca. Os hangares estavam abertos e engalanados, com vasos de flores e bandeiras. E, por detrás dos festões de verdura, encontravam-se alguns aparelhos que, por não estarem em condições, não participaram da festa. Numa mesa em frente da tribuna presidencial, estavam as taças e outros prémios, figurando em primeiro plano o troféu «Diário de Notícias» e a Taça do «Diário de Lisboa».
    Pouco antes das 14 horas, fez-se a apresentação ao público do Grupo de Bombardeamento, subindo 9 «Potez», sob o comando do sr. major Pinheiro Correia, que realizaram diversas evoluções, com diferentes formaturas. Às 14 horas, chegou ao campo a companhia indigena de Angola, com bandeira, banda e terno de clarins, despertando muito interesse a marcha dos soldados. Entretanto iam chegando as entidades oficiais:generais Amilcar Pinto, Daniel de Sousa, Bernardo do Canto e Eduardo Marques; brigadeiros Silveira e Castro, director da Aeronautica Militar, e João de Almeida; almirante Sarmento Saavedra; encarregado de negócios de Inglaterra; adidos militares de Espanha, de Inglaterra , dos Estados Unidos e da Italia, e adido aeronáutico francês, acompanhado pelo sr. tenente-coronel Esmeraldo Carvalhais; comandante Afonso de Cerqueira e Oliveira Musanty, oficiais do Exército e da Armada; aviador civil Torre do Vale, etc.
    Eram 14h20, quando surgiram no campo, acompanhados por suas esposas, os srs. ministros da Guerra e da Marinha. O sr. major Alberto de Oliveira passou revista à companhia indígena. Uma esquadrilha de três Junkers da Aviação Naval evolucionou sobre o campo, prestando assim o seu concurso à festa. Em frente do aeródromo, na ribeira de Alverca, haviam diversos barcos embandeirados e cheios de gente.
   Um incêndio na pista
   Começaram as provas da tarde por uma exibição de acrobacia em conjunto, sendo o grupo constituído por 3 aviões de Sintra, tripulados pelos srs. major Craveiro Lopes e tenentes Macedo e Andrade. Depois de realizado o «looping» vulgar, um deles fez um «looping», enquanto os outros faziam «renversements» direito e esquerdo. Seguiu-se a fila indiana, o «carrousel» em «looping», e por ultimo o «looping» em patrulha, aterrando os aparelhos, por entre aplausos do público.
    Pouco antes das 15 horas, crê-se que devido a faúlha duma locomotiva, começou a arder o restolho numa das extremidades da pista, tendo o incêndio certa gravidade, porque o vento impelia as chamas para o local onde estavam alinhadas as esquadrilhas. O fogo foi imediatamente atacado pelos bombeiros de Alverca e de Vila Franca, mas como os esforços destes fossem impotentes para o dominar rapidamente, intervieram os soldados de Angola, enquanto os mecânicos e os soldados de Alverca arrastavam os aviões para mais longe.
    Às 15h15 o fogo era extinto, sendo os negros e os bombeiros muito aplaudidos pelo público. Às 16 horas, muito depois da hora marcada, devido ao facto da estrada estar cheia de automóveis, chegou o sr. presidente da República, e pouco depois os almirantes da esquadra francesa, tocando a banda da companhia indígena de Angola o hino nacional. O público estendia-se já até aos montes próximos.
    Um avião destruído
    Iniciou-se a prova individual de acrobacia, subindo primeiro o capitão Cardoso, que foi muito aclamado. Em seguida, quando o capitão Metelo levantava vôo, a uns 15 metros do solo, pretendeu fazer um «looping» mas a manobra foi apertada, e o aparelho - um «Tiger Moth» - teve uma perda de velocidade e veio estatelar-se a poucos metros da tribuna presidencial, ficando com a hélice e parte do motor enfiados no solo.
    Um frémito de ansiedade perpassou por toda a assistência, pois todos tiveram receio de que alguma coisa de grave sucedesse ao piloto, visto que o avião ficou com a fuselagem e as asas despedaçadas e o motor muito danificado. Finalmente, o capitão Jorge Metelo - que foi facilmente tirado da carlinga, por alguns camaradas - estava apenas ferido, sem gravidade, na cabeça.
Para evitar a explosão do motor, grupos de soldados despejaram sobre o aparelho numerosos baldes de água. Restabelecida a tranquilidade e retirado o avião da pista, continuou a prova de acrobacia individual, subindo o capitão Pimenta num «Junkers-Junior» e entusiasmando a asssistência com os arriscadíssimos exercícios.
    Três aeroplanos avariados
    O sr presidente da República, descendo da tribuna com os ministros, na opresença de todas as forças, fez entrega ao Grupo de Alverca da sua nova bandeira, abraçando o seu comandante, sr. major Pinheiro Correia. As bandas de Infantaria 1 e da companhia de Angola tocaram »A Portuguesa» e as forças desfilaram em continência.
    O tenente Plácido de Abreu foi para o ar, no «Junkers-Junior» em que foi a Cleveland, e executou as provas que naquele certame lhe deram um lugar tão honroso. Fez evoluções admiráveis, a poucos metros do solo, provocando o espanto do público e aplausos calorosos. E, ao aterrar, veio até em frente à tribuna presidencial, onde o chefe do Estado e os ministros o felicitaram. Subiu depois, o tenente Macedo, da Escola de Sintra, continuando as provas, com grande interesse do público que não arreda pé.
    Outro fogo no restolho
    Cerca das 17h30, declarou-se novamente fogo, desta vez, perto do «Junkers Monteiro Torres» que teve de ser retirado à pressa, para longe, por mecânicos e soldados. Os bombeiros, com o auxílio dum auto-tanque, conseguiram extinguir em dez minutos o incêndio que o vento ateava com violência.
    Um acto de «sabotage»
    Pouco depois, foi preso um indivíduo, com aspecto de trabalhador, que foi surpreendido por dois soldados, quando cortava, com uma navalha, a tela dum dos aviões. Declarou que estava a ver se a tela era resistente. Mas as dimensões do corte já realizado eram elucidativas das suas intenções, motivo por que o criminoso ficou preso no Grupo de Bombardeamento. Os soldados tiveram que cercá-lo, para evitar que ele fosse linchado. E as precauções tomadas, por essa razão, impedem que comuniquemos com o preso e que possamos dar já a sua identidade.
    Depois de Plácido de Abreu voar, fez-se a caça aos balões e iniciou-se a destruição da aldeia. Os aviões obrigaram a retirar a guarnição de metralhadoras que ali se encontrava e estão bombardeando a aldeia, provocando este espectáculo grande impressão no público.
    Outro desastre
    Pelas 18h30, quando o «Potez» 14, tripulado pelo major Pinheiro Correia, regressava do exercício de bombardeamento da aldeia, ao aterrar no extremo da pista, afocinhou, devido a um golpe de vento,  caindo sobre a asa direita que partiu, bem como a hélice e trem de aterragem, e ficando com a cauda no ar. Então, o público, não respeitando os cordões estabelecidos, invadiu o campo, ao mesmo tempo que muitos automóveis e a ambulância de Alverca seguiam para o local do desastre.
    A breve trecho, o sobressalto do público terminou, porque o major Pinheiro Correia saltou, sorridente, da carlinga, tendo apenas um leve ferimento no nariz. Deu-se, depois, no campo, uma certa confusão, porque alguns aparelhos tinham que aterrar, e por toda a parte havia gente. Um popular teve, mesmo que se deitar no chão para não ser colhido por um aeroplano. Terminadas as provas, o sr presidente da Republica retirou para Lisboa.
    A prova de acobracia
    O juri da prova de acrobacia, presidido pelo major Antonio Maia, declarou à imprensa que o 1º prémio - troféu «Diario de Noticias» - fora atribuído ao tenente Macedo, o 2º ao tenente Pimenta e o 3º ao capitão Cardoso, acrescentando: - o juri, apesar de ter considerado o tenente Placido de Abreu o melhor entre todos os concorrentes, resolveu desclassificá-lo, por não ter realizado na ordem que o programa marcava, duas das provas, embora no final da exibição as fizesse. (fim da transcrição)
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Abaixo alguns dos tipos de aeronaves envolvidas no festival de 1933.

Potez 25 A2 do GIAB, então instalado em Alverca.
 
Junkers K43-W da Aviação Naval

DH-82 Tiger Moth usados na Escola Militar de Aeronautica de Sintra

Junkers - A50 Junior (único) Junior da Aeronautica Militar na Amadora

Junkers W34L "Monteiro Torres" (único) da Aeronautica Militar na Amadora.

Avro 504K da Escola Militar de Aeronautica (EMA) em Sintra

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